Esse anúncio do não
descenso da Grande Rio e do Império Serrano nos causa uma estranheza muito
grande. Uma estranheza e um desânimo também muito grande com o Carnaval
carioca. Eu acho que uma festa como a nossa precisa, antes de tudo, ter
credibilidade.
E no momento em que, mais uma vez, pelo segundo ano consecutivo,
o regulamento é rasgado, é totalmente desprezado, a gente cria aquela situação
de impotência, de perplexidade mesmo pelo que está acontecendo.
Será que os dirigentes não estão percebendo que é um tiro do pé
atrás do outro? Ano passado, não desceu ninguém; primeiro tiro no pé. Depois, a
vitória da Mocidade; o segundo tiro no pé. E agora mais esse terceiro tiro no
pé, que eu já acho até que é um tiro de canhão no pé.
Então, o samba começa a perder aficcionados. As pessoas que
gostam começam a se desmotivar, a perder a empolgação com o Carnaval. Se esse
ano nós tivemos 90% de lotação no sambódromo, eu não duvido que ano que vem nós
temos 80%, 70%, ou seja, o interesse do grande público começa a desaparecer.
Um quarto tiro no pé foi não ter ensaio técnico. A Liesa e as
escolas como um todo não estão sabendo administrar, gerir o Carnaval carioca.
Elas têm um produto maravilhoso, que o mundo todo admira, que nós todos
admiramos, e elas estão relegando esse produto a um segundo plano. Decidem o
que eles querem, a hora que eles querem. E o que nos magoa muito é a gente
perceber, por exemplo: se caísse o Império Serrano e a São Clemente? Se caísse
Império Serrano e União da Ilha? Ou União da Ilha e São Clemente? Nada disso
estaria acontecendo. As escolas teriam ido para a Série A, sem nenhum
comentário, sem nada demais.
Esse corporativismo das escolas de samba está levando-as para o
buraco. Como um investidor, por exemplo, um empresário, vai ter interesse em
investir num Carnaval que acaba em pizza? Que é tudo na verdade uma grande
brincadeira…
E a figura do julgador, que tem um trabalho, tem uma
responsabilidade, estuda tudo aquilo, pega um calhamaço de um livro abre-alas
que é gigantesco… e ele vai, julga com seriedade, tentando fazer a
diferenciação entre as escolas e, no final, não cai ninguém.
É um erro em cima de erro.
Estava vendo as escolas e a Liesa muito quietinhas, muito
caladas. Imaginei que nós teríamos, finalmente, o cumprimento do regulamento.
Mas, infelizmente, ele foi jogado, mais uma vez, no lixo.
Uma situação que me incomoda muito: imaginemos a cabeça do
julgador. Ele está presenciando o que está acontecendo. E na cabeça dele, já
rola o seguinte: peraí, eles não derrubam escola grande. A escola do esquema
deles, eles não derrubam. Então, ano que vem, se esse julgador estiver
julgando, por exemplo, a Grande Rio, ele vai lembrar que a escola não desceu
esse ano por um corporativismo da Liesa e das escolas. E o julgador, em vez de
dar um 9,8, de repente ele dá um 9,9 ou 10, porque ele sabe que essa escola é
imexível. Ou seja, você cria um círculo vicioso perigosíssimo para todo o
Carnaval.
É triste, fico muito desanimado. A gente luta tanto por isso,
pela seriedade, pelo regulamento. O que adianta fazer regulamento? Então não
faz.
A gente vê a situação que deve ser conversada daqui para frente
da ordem dos desfiles. A Viradouro está lá com o mérito próprio, a São Clemente
ficou por mérito próprio no Grupo Especial e, de repente, a São Clemente abre
em um dia e a Viradouro em outro dia. E as duas que não desceram, que estão,
digamos, “por favor”, elas vão poder escolher de repente o dia. Eu não gosto
deste rasgar regulamento. Já rasgou uma vez, vamos rasgar de vez.
Então, sinceramente, é desalentador. A gente perde a vontade,
perde o pique, fica desanimado. Inclusive nós, que fazemos parte da mídia
carnavalesca, ficamos muito tristes porque as pessoas são incapazes de ouvir o
que a gente fala. A gente serve para que? Para premiar, nos desgastar, ficar
quatro dias na Avenida, cinco dias com o Sábado das Campeãs, analisando,
debatendo o Carnaval, trocando informações e eles depois mudam tudo o que a
gente falou. Não adiantou nada a gente falar, analisar. Eles acabaram com tudo
isso.
Eu fico muito triste, muito desanimado. Espero que um dia as
escolas percebam as bobagens que elas vêm fazendo direto. É um tiro no pé atrás
de outro. Só que esse tiro está pegando em alguém, que é no público que gosta,
que é apaixonado pelas escolas de samba. Lamento profundamente esta decisão da
Liesa e vejo que o nosso Carnaval que a gente gosta tanto está cada vez mais
perdendo credibilidade.
Fonte: www.srzd.com
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