A Portela divulgou, na noite desta quinta-feira
(28), a sinopse do enredo “Na Madureira moderníssima, hei sempre de ouvir
cantar uma Sabiá”, da carnavalesca Rosa Magalhães.
Confira a sinopse:
‘Na Madureira moderníssima, hei sempre de ouvir
cantar uma Sabiá’
A Portela vai apresentar no carnaval de 2019 uma
homenagem à cantora Clara Nunes, ressaltando a diversidade e a atualidade de
sua trajetória biográfica e seu vasto e plural repertório musical, constituído
de sambas-canção, sambas-enredo, partidos-altos, marchas-rancho, forrós, xotes,
afoxés, repentes e canções de influência dos pontos de umbanda e do candomblé.
Para isso, pretende sair do lugar-comum das narrativas sobre sua vida ou de uma
colagem de títulos de sua discografia. Nossa escola exalta a importância
cultural de Madureira, das festas, terreiros e do contagiante carnaval popular,
enfatizando a contribuição do bairro para a formação da identidade que
caracterizou Clara Nunes: a brasilidade.
O meu lugar,
tem seus mitos e seres de luz.
É bem perto de Oswaldo Cruz*
Em 1924, no primeiro carnaval da Portela, fundada
em abril do ano anterior, o coreto de Madureira, criado pelo cenógrafo José
Costa, reproduzia a imponente Torre Eiffel. Visitando o bairro na companhia de
alguns amigos, Tarsila do Amaral não apenas eternizou aquela imagem numa tela,
como também mostrou para seus pares modernistas que as festas populares do
nosso subúrbio incorporavam os mais diversos elementos culturais. Sem dúvida,
Madureira sempre teve um ar moderno, como a própria trajetória de Clara Nunes,
que parece ter emergido de uma obra modernista, como se fosse uma tela da
Tarsila: a Mineira representa a mais plural expressão da brasilidade. Morena.
Mestiça.
Porque tem um sanfoneiro no canto da rua,
fazendo floreio pra gente dançar,
tem Zefa da Porcina fazendo renda
e o ronco do fole sem parar**
Clara nasceu no interior mineiro, num lugar que
hoje se chama Caetanópolis. Ainda menina, trabalhou numa fábrica de tecidos
para conseguir sobreviver, mas seu destino já estava traçado. Tinha como missão
cantar o Brasil! Ao longo da infância, conheceu de perto as tradições
culturais e as festas folclóricas interioranas, certamente recebendo influência
de seu pai, Mané Serrador, mestre de canto de Folia de Reis e violeiro dos
sertões das Gerais.
Sua brasilidade, como herança de sua origem, sempre
valorizou a diversidade regional de nosso país. A voz de Clara fez ecoar os
ritmos do povo, na saborosa confusão dos mercados populares, seja do nordeste
ou de qualquer outro recanto desta nação.
Alçando voos mais ousados, Clara mudou-se para Belo
Horizonte, onde participou de concursos, realizou os primeiros trabalhos
artísticos e conquistou espaço nos meios de comunicação. Chegando ao Rio
de Janeiro, seguiu fazendo sucesso e conheceu o misticismo que aflorava em
Madureira, incorporando-o à sua identidade.
Sou a Mineira Guerreira,
filha de Ogum com Iansã***
Até então, a artista cantava principalmente boleros
e sambas-canções. Após ter contato com o ancestral universo afro-brasileiro de
Madureira, a mineira se transformou igual ao céu quando muda de cor ao
entardecer. E nunca mais foi a mesma: visitou os terreiros, quintais e morros
de Oswaldo Cruz e Madureira, vestiu-se de branco, incorporou colares, turbantes
e contas, cantou sambas e pontos de macumba. Seu repertório se expandiu. A
imagem de Clara evocando os Orixás, irmanada ao povo de Santo, eternizou-se na
memória de seus fãs. Ela se tornou a Guerreira que não temia quebrantos,
dançando feliz pelas matas e bambuzais, sambando descalça nas areias da praia,
unindo a essência negra de Angola ao subúrbio carioca. E assim, sua voz
rapidamente se espalhou. Seu canto correu chão, cruzou o mar, foi levado pelo
ar e alcançou as estrelas. Uma força da natureza que brilhou como um raio nos
palcos e terreiros, iluminando o coração dos portelenses. Nada disso foi por
acaso.
Portela, sobre a tua bandeira
esse divino manto.
Tua Águia altaneira
é o Espírito Santo
no templo do samba****
Desde que foi fundada, a Portela tem uma presença
significativa de elementos típicos do mundo rural, trazidos pelo povo simples
do interior, sobretudo do interior de Minas Gerais, mesclados à negritude que
vibrava em Madureira. Talvez tenha sido por isso que a identificação de Clara
com a Portela foi imediata. Ela sempre ocupou posição de destaque nos desfiles,
é madrinha da Velha Guarda e até puxou sambas-enredos na avenida. Ela e
os portelenses, famosos e anônimos, sempre caminharam de mãos entrelaçadas,
voando nas asas da Águia.
Um dia, inesperadamente ela partiu. Trinta e cinco
anos se passaram desde então. A dor da saudade sempre reverberou no coração de
todos, tornando-a uma estrela ainda mais cintilante.
Agora está na hora de a Guerreira reencontrar seu
povo mestiço, para mais uma vez brilhar na avenida. Vestida com o manto azul e
branco e a Águia a lhe guiar, voa minha Sabiá.
Até um dia!
Carnavalesca: Rosa Magalhães
Sinopse: Fábio Pavão e Rogério Rodrigues
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* O Meu Lugar – Arlindo Cruz e Mauro Diniz
** Feira de Mangaio – Glorinha Gadelha e Sivuca
*** Guerreira – João Nogueira e Paulo Cesar
Pinheiro
**** Portela na Avenida – Paulo Cesar Pinheiro e Mauro Duarte