Mapa de notas do julgador Bruno Rodrigues possui trechos parecidos com artigo publicado em site, no final de 2012
Por Rafael Arantes
Rio - Dias após a divulgação das justificativas das notas do Grupo Especial, o mundo do samba ainda repercute os pontos perdidos pelas agremiações do Rio. Entretanto, uma situação no mínimo inusitada passou a intrigar os amantes do grande espetáculo. Neste sábado, diversas semelhanças entre as justificativas do jurado Bruno Rodrigues, de Samba-enredo, e uma publicação do presidente da LIESV, João Marcos, em sua antiga coluna no site Sambario, foram constatadas, e o fato causou perplexidade entre os sambistas.
A análise feita pelo dirigente da Liga das Escolas de Samba Virtuais consistia em uma visão pessoal sobre cada obra do Grupo Especial do Rio, dando direito até mesmo à notas para cada uma das canções. No entanto, as semelhanças, principalmente na escrita, das justificativas da Vila Isabel, Salgueiro, Tijuca, Imperatriz e São Clemente já repercutem com grande intensidade.
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Procurado pelo DIA na Folia, o ex-colunista falou sobre a situação. João admitiu a surpresa ao notar as semelhanças, mas deixou claro que não vê problemas caso o julgador tenha se inspirado em suas análises feitas na época em que o CD foi lançado. Na rede, os internautas chegaram a acusar o julgador de plágio, mas o fato foi descartado por João Marcos.
"Talvez o jurado acompanhe o que sai na internet, pode ter lido meus comentários no site e achou que algumas das minhas justificativas teriam fundamento, e se for isso, acho até normal. Confesso que achei engraçado, inicialmente, mas não acho que exista um problema de transparência, o jurado efetivamente julgou, teve diversos entendimento diferentes do meu. Se ele leu e achou interessante a forma como eu escrevi, não vejo problemas, fico feliz de um maestro ter visto propriedade no que eu escrevi", declarou João.
Julgador nega 'cópia' e garante legitimidade
Diante do fato Bruno Rodrigues negou qualquer relação entre suas justificativas e a publicação feita no final de 2012 e fez questão de ressaltar que os conceitos utilizados para realizar suas análises sobre o samba vai muito além dos conhecimentos pessoais. De acordo com o julgador, qualquer semelhança não passa de "mera coincidência", já que não possui o hábito de frequentar o site em questão.
"Com certeza foi uma mera coincidência. Não cheguei, sequer, a ver esta publicação. Não frequento, e se não me engano, nunca fui a este site. Minhas justificativas se baseiam nos meus pontos de vista, busco ao máximo deixar claro minhas opiniões, tanto que em diversos casos cheguei a ultrapassar o limite de onde deveríamos escrever. Além de julgador, sou uma pessoa que trabalha com a música. Sou maestro, pedagogo, bacharel em música, tenho doutorado em artes, e tudo que coloco ali são coisas que, ao meu ver, existiram. Se há uma semelhança, é apenas uma feliz coincidência, e não digo triste, pois é bom saber que existem pessoas que pensam da mesma maneira que eu. Julgo a qualidade do que está sendo demonstrado, não me importo com outros pensamentos", disse Bruno, que ainda comentou a tão criticada justificativa sobre os pontos retirados do samba da campeã Vila Isabel, considerado o melhor do ano por diversos órgãos relacionados ao Carnaval.
"Gosto de deixar bem claro que não julgo nenhuma escola pela bandeira, ou pelo nome. Para mim, o que importa é o samba, é a obra que foi feita. No caso da Vila Isabel, por exemplo, fui muito criticado por ter tirado pontos do samba que foi considerado, por muitos, o melhor do Carnaval. Entretanto, no meu ponto de vista, os melhores sambas foram da Portela e Beija-Flor, exatamente para quem dei nota 10. No samba da Vila, em um certo momento, houve uma paralisação em tom médio-grave por 42 segundos, sem conseguir chegar a uma explosão como acontece na primeira parte. Uma das coisas que nem cheguei a escrever foi a presença de um trocadilho. No trecho 'é a lida', muitos componentes, e até membros do carro de som cantavam 'é a Vila'. Minhas observações ainda iriam muito além daquilo", concluiu.
Confira algumas das semelhanças que estão gerando polêmica na Internet:
UNIDOS DA TIJUCA
João Marcos - "É um samba pragmático, como pede o enredo. Quem leu a sinopse sabe que o tema era complexo, difícil para o compositor. E a letra deste samba é competente ao seguir o direcionamento artístico do carnaval da escola. A técnica de enumerar os diversos tópicos de forma genérica, só especificando os momentos mais importantes (que são os que terão alegorias, como a parte da floresta, p.ex.) acaba fazendo com que a letra não passe muito bem o que é a Alemanha encantada, mas ao mesmo tempo evita versos “trash”. Evidentemente, há um deslize aqui e ali – o final da primeira, com seu “Balança o povo, embala a emoção / E mexe com meu coração”, traz uma rima pobre, sem contexto na sinopse, e versos sem qualquer função dentro da obra a não ser preencher espaços vazios. Mas até aí, nada demais. A melodia é que eu acho muito chapada, sem ginga e quadradona, apesar de algumas tentativas de variações, como no “Tijuca... Querida... Razão da minha vida” ou no “Da vida ao motor... ao girar”. No concorrente e no vídeo do coral, existiam partes em que a melodia estava claramente indefinida, e que foram bem enfrentadas pelo intérprete Bruno Ribas, apesar de ele não tem solucionado de forma convincente o maior problema de todos, os versos ”Seres, magia do meu carnaval / Pela floresta surge um olhar”. O samba seria bem discreto se não fosse a boa sacada do refrão de cabeça. Enfim, faixa morna, com a cara da safra. NOTA: 7,8."
João Marcos - "É um samba pragmático, como pede o enredo. Quem leu a sinopse sabe que o tema era complexo, difícil para o compositor. E a letra deste samba é competente ao seguir o direcionamento artístico do carnaval da escola. A técnica de enumerar os diversos tópicos de forma genérica, só especificando os momentos mais importantes (que são os que terão alegorias, como a parte da floresta, p.ex.) acaba fazendo com que a letra não passe muito bem o que é a Alemanha encantada, mas ao mesmo tempo evita versos “trash”. Evidentemente, há um deslize aqui e ali – o final da primeira, com seu “Balança o povo, embala a emoção / E mexe com meu coração”, traz uma rima pobre, sem contexto na sinopse, e versos sem qualquer função dentro da obra a não ser preencher espaços vazios. Mas até aí, nada demais. A melodia é que eu acho muito chapada, sem ginga e quadradona, apesar de algumas tentativas de variações, como no “Tijuca... Querida... Razão da minha vida” ou no “Da vida ao motor... ao girar”. No concorrente e no vídeo do coral, existiam partes em que a melodia estava claramente indefinida, e que foram bem enfrentadas pelo intérprete Bruno Ribas, apesar de ele não tem solucionado de forma convincente o maior problema de todos, os versos ”Seres, magia do meu carnaval / Pela floresta surge um olhar”. O samba seria bem discreto se não fosse a boa sacada do refrão de cabeça. Enfim, faixa morna, com a cara da safra. NOTA: 7,8."
Bruno Rodrigues - "Metade do meu coração é Tijuca, a outra metade Tijuca também'. A marca é este refrão fortíssimo, um dos melhores do ano, com um jogo de palavras cativantes, mas não original, já que o cantor e compositor Osvaldo Montenegro já o utilizara numa canção intitulada 'Metade', e óbvio, não tem nada a ver com o enredo. As partes que mais centralizam as atenções no samba-enredo são as que exaltam a escola. O Final da primeira parte, com seu 'Balança o povo, embala a emoção, e mexe com o meu coração' traz uma rima pobre, sem contexto na sinopse. Melodia fraca, sem balanço e quadrada. Letra: 4,8/Melodia: 4,9/Nota: 9,7"
VILA ISABEL
João Marcos - "O Dream Team de compositores da Vila Isabel fez uma obra que, sem sombra de dúvidas, deu certo. É um ótimo samba, gostoso, com letra singela, que passa bem o clima do enredo. Sem invencionismos, sem bobagens. O refrão do meio é espetacular. Faço ressalvas ao início da segunda – é óbvio que a ideia ali é jogar um pouco mais para baixo para depois vir o “grand finale” – não é um erro, é opção estética, porém acho que a dose foi um pouquinho maior do que a necessária. Talvez o ideal fosse fazer algo mais próximo do esquema da primeira parte, que inicia forte, cai um pouquinho para depois entrar o “É a lida” rasgando. Na letra, também não gosto da enumeração de verbos no infinitivo em “Preciso investir, conhecer / progredir, partilhar, proteger”. Analisando as características dos compositores, é bem claro que há certo predomínio do estilo de Arlindo Cruz, o que foi bom para a obra por ele ser o meio termo entre a dolência e a ginga de Martinho e a explosividade de André Diniz. Bola dentro. NOTA: 9,5"
Bruno Rodrigues - "Samba com letra singela, que passou bem o clima do enredo. O refrão do meio é muito bom. Faço ressalvasno início da segunda. É obvio que a ideia ali é de crescer, ir para 'baixo', para depois vir a 'apoteose'. Não é um erro crasso, mas sem dúvidas uma opção estética composicional dos autores. Porém, acho que a dose foi um pouco maior do que a necessária. Sem dúvidas acho que o ideal fosse fazer algo mais próximo do esquema da primeira parte, que inicia forte, decresce para depois entrar o 'É a lida' que tem ótima resolução. Na letra, também faço ressalvas, não gostei da enumeraçãode verbos no infinitivo em 'preciso investir, conhecer, progredir, partilhar, proteger'. Letra: 4,9/Melodia: 4,9/Nota: 9,8"
SALGUEIRO
João Marcos - "Um samba com boas variações melódicas, seguindo o modelo adotado pela escola desde o samba sobre o Rio de Janeiro. Aliás, o espírito dele é bem semelhante ao do samba do Rio no Cinema, e tem problemas parecidos, principalmente na primeira parte em termos de métrica, com versos longos que não cabem na melodia. Não gosto especialmente da entrada da primeira, que ficam sem rimas definidas. Os refrões, tanto o de cabeça como o do meio, são excelentes. A segunda é bem construída e achei interessante a participação do Xande do Revelação, que tem um estilo de cantar samba-enredo parecido com os cantores de São Paulo e deu um molho diferente na faixa. A letra me agradou muito, passando um enredo inusitado com clareza através de versos bem humorados. NOTA: 8,2"
João Marcos - "Um samba com boas variações melódicas, seguindo o modelo adotado pela escola desde o samba sobre o Rio de Janeiro. Aliás, o espírito dele é bem semelhante ao do samba do Rio no Cinema, e tem problemas parecidos, principalmente na primeira parte em termos de métrica, com versos longos que não cabem na melodia. Não gosto especialmente da entrada da primeira, que ficam sem rimas definidas. Os refrões, tanto o de cabeça como o do meio, são excelentes. A segunda é bem construída e achei interessante a participação do Xande do Revelação, que tem um estilo de cantar samba-enredo parecido com os cantores de São Paulo e deu um molho diferente na faixa. A letra me agradou muito, passando um enredo inusitado com clareza através de versos bem humorados. NOTA: 8,2"
Bruno Rodrigues - "Os dois refrões, sobretudo o central,são, em minha opinião, as melhores partes. A citação a John Lennon "Imagine" é sem dúvidas a parte mais criativa da letra, que possui bons e maus momentos. O Samba tem um problema sério, principalmente na primeira parte, em termos de métrica, com versos longos que não cabem na melodia. Não gostei especialmente da entrada da primeira que ficam sem rimas definidas. Um enredo que não provoca grandes versos, e sem dúvidas, não teve uma melodia consistente. Letra 4,8 / Melodia 4,8 / Nota: 9,6"
Fonte: O Dia na Folia