Após eleição disputadíssima, Portela vive tempo de pacificação
Por João Antonio Barros
Nova diretoria contrata reforços e faz mudanças até na eleição da rainha de bateria e na feijoada para tirar o amargor de 29 anos sem vitórias
Rio - Com a mesma destreza que há três anos hasteou a bandeira azul e branca do Estado do Rio de Janeiro no alto do Complexo do Alemão — símbolo da retomada do controle da comunidade —, o subtenente da PM Marcos Falcon finca outra bandeira, com as mesmas cores, no centro da quadra da Portela. “É tempo de reunir a escola, queremos todo mundo aqui, sem revanchismo”, clama o policial, eleito vice na chapa que elegeu Serginho Procópio presidente e Monarco, presidente de honra.
Para libertar a águia da paz e colocar um ponto final na briga que transformou as eleições em um campo de batalha — vencida com apenas três votos de diferença —, Serginho estendeu a mão até para o antecessor, Nilo Figueiredo: “Será sempre bem-vindo aqui.”
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Tempo de paz e de tocar o Carnaval do próximo ano. E, logo de cara, cumprir a principal promessa de campanha: levar a escola de volta às raízes. O primeiro passo já foi dado. Na semana inaugural de trabalho, a nova direção da Portela fechou parceira para construir o Palácio da Velha Guarda, espécie de centro de sociabilidade que será erguido com a reforma do prédio onde hoje funciona a Portelinha.
Outra novidade é a escolha da rainha da bateria, agora através de concurso e aberto às jovens da comunidade, com a candidata obrigada a preencher três requisitos: beleza, samba no pé e viver fora do círculo artístico.
Nada contra o holofote global, mas a ideia é a moça ter a cara do samba de Madureira, que, aliás, será o marco regulatório na decisão dos diretores da Portela e que influenciou-a a abolir o chamado “enredo patrocinado”. “Queremos contar história sem prejuízo ao bom samba e ao bom desfile. Vamos com um tema de relevância cultural”, informa Serginho, que esta semana espera ter em mãos o rascunho do enredo lapidado pelo recém-contratado carnavalesco Alexandre Louzada.
“Mas anota: não vamos desfilar para competir em 2014, vamos disputar o título”, provoca Falcon, que se reuniu com um grupo de empresários disposto a ajudar a reerguer as combalidas finanças da escola, mergulhada em dívidas com prestadores de serviços e empregados, que podem totalizar R$ 7 milhões. “Libertamos a escola de oito anos de domínio de um grupo político. Agora é preciso esquecer o passado”, alfineta o PM, que surpreendeu-se com antigos credores batendo à porta da escola no dia seguinte à vitória: “Mas não vieram cobrar, vieram abrir o crédito, querem nos vender”, revela.
Paulinho da Viola, Monarco e Lan serão beneméritos
O retorno às raízes levou a nova diretoria a um exame de consciência e ficou decidida justa homenagem a três ícones da Portela: o cantor e compositor Paulinho da Viola, o cartunista Lan e o músico Mauro Diniz. Eles vão receber o título de sócio benemérito pelos anos de dedicação à escola. “Sempre ajudaram a divulgar a Portela e tornaram a escola referência no samba. Não entendo a razão da homenagem não ter acontecido antes”, anuncia Marcos Falcon.
Para pagar a conta com os tempos de abandono da Velha Guarda, o presidente Serginho Procópio levou a Tia Surica de volta à cozinha — e nem pensar em machismo aqui. Uma das primeiras mulheres a puxar o samba-enredo na Avenida, ela vai comandar de novo a tradicional Feijoada da Família Portelense — realizada no primeiro sábado de cada mês.
A estreia será no próximo dia 1º de junho — justamente a que comemora a vitória da oposição. E tem novidade no tempero. Nada de comida industrializada: a partir de agora, é regra o preparo caseiro. Na feijoada, Serginho promete os detalhes sobre como será a inscrição e a escolha da rainha da bateria. “Estamos preparando os critérios de seleção e para eleger a vencedora, mas será uma representante da comunidade”, adianta.
Elenco ‘de ponta’ para garantir vitória
O caixa vazio da Portela não reduziu o apetite da direção nas ‘compras’ para o Carnaval. Numa tacada só, anunciou a megaequipe para puxar o samba na Avenida: além do intérprete Wantuir, a escola terá Richahs, Rogerinho e Cremilson no carro de som. E apanhou na concorrência o diretor de Carnaval Luiz Carlos Bruno, que já foi da Unidos da Tijuca, e a coreógrafa Ghislaine Cavalcanti, ex-Beija-Flor de Nilópolis, para comandar a Comissão de Frente. A porta-bandeira será Danielle Nascimento, neta de Natal, eterno patrono, e filha de Vilma Nascimento.
O time carnavalesco, para livrar a Portela do jejum de 29 anos à espera de um título na Marquês de Sapucaí, ainda terá outros nomes, que serão escolhidos esta semana. Na diretoria, as vagas também serão preenchidas a partir de hoje. Certa está a indicação de Áurea Maria — filha e parceira do lendário compositor portelense Manacéa — para a diretoria social.
21 TÍTULOS: A Portela conquistou, desde 1932, nos desfiles que as escolas de samba realizam anualmente no Rio de Janeiro
R$ 7 MILHÕES: Valor a que podem chegar as dívidas da escola, mergulhada em débitos com prestadores de serviços e empregados. Isso sem falar nos calotes dados em fornecedores