Sete vezes campeã do Carnaval, premiada com o Emmy, responsável por cerimônias de abertura (Pan 2007) e encerramento (Olimpíada 2016) de eventos esportivos, cenógrafa e figurinista consagrada em trabalhos por todo o mundo. Rosa Magalhães poderia se considerar realizada e prestes a se aposentar. Mas ela quer mais. Dá expediente diariamente no barracão da Portela para realizar um dos desfiles mais aguardados pelos torcedores da azul e branca: o que vai homenagear a cantora Clara Nunes na segunda-feira de Carnaval (confira a programação dos desfiles do Rio).
Nesta entrevista exclusiva, Rosa fala de como foi elaborar um enredo que é um marco em sua carreira: pela primeira vez, a premiada carnavalesca apostará em fantasias relacionadas à religiosidade africana. E encara com bom humor a responsabilidade de levar a Portela a mais um campeonato.
UOL - Em sua carreira, fazer um enredo-homenagem não foi muito comum e citar a religiosidade africana é novidade. Como foi a elaboração do enredo?
Rosa Magalhães - Apanhei muito [risos]. Você tem que entender exatamente como era a Clara Nunes e sua trajetória. A religiosidade dela é algo muito particular, o mineiro normalmente já é bastante religioso e ela exalava essa espiritualidade. Eu li a biografia dela, escrita pelo Vagner Fernandes, e o procurei para tirar várias dúvidas. Queremos mostrar a ligação da Clara com a Portela e sua personalidade, que sempre teve uma visão brasileiríssima e moderna. Ela era uma pessoa à frente de seu tempo. Assumiu o cabelo crespo numa numa época em que as mulheres procuravam alisar. Não à toa Clara se identificou com a Portela, que sempre foi uma escola de vanguarda, assim que foi trazida pelo Adelzon Alves [radialista e, à época, namorado da cantora].
Em sua forma peculiar de contar o enredo, você junta a modernidade de Clara à de Tarsila do Amaral. Como funciona essa ligação?
Em primeiro lugar, Madureira é um polo importante para a vida cultural e comercial da cidade. Sempre foi. No início do século passado, aconteceu um concurso de coretos entre os bairros. Aí um comerciante de Madureira fez um coreto em forma de Torre Eiffel, com 18 metros de altura. E Tarsila foi a Madureira, com um grupo de franceses, conheceu o coreto e fez o quadro "Carnaval em Madureira". E isso foi praticamente na época em que a Portela foi fundada. Por isso, abriremos o nosso desfile mostrando o Carnaval do bairro. Depois a Clara entra no desfile. Mostraremos sua trajetória, de Minas para a Portela, sem esquecer de sua religiosidade.
Como foi desenhar fantasias de orixás pela primeira vez?
Ninguém sabe, mas já estudei muito orixás. Uma vez fiz um balé no Teatro Castro Alves, na Bahia. E o tema era orixás. Eu disse que não sabia nada disso e me responderam: "Vá estudar" [risos]. Se eu não fui espinafrada na Bahia, não será aqui que eu serei, porque passei na prova! Com isso, mantive um material que ainda consulto. Estudei muito para botar esse Carnaval na rua. E é incrível pensar que, há 40 anos, a Clara Nunes se apresentava nos programas de TV mostrando todo esse universo místico, que hoje é perseguido. Precisamos trazer essa mensagem de tolerância a todas as crenças.
Como é fazer um enredo esperado há tanto tempo? De quem partiu a ideia?
A ideia foi do presidente da escola, Luis Carlos Magalhães. Ele me propôs e aí passamos a discutir as ideias de como seria. Elas iam para a diretoria e voltavam. E encontramos uma forma de mostrar a ligação de Clara Nunes com a Portela, com a brasilidade. A Portela é o fio condutor da história.
As pessoas colocam a Portela como favorita. Como você lida com essa responsabilidade? Eu quero é ganhar! Alguém vai lá para perder?
Espero que ninguém tenha a mesma ideia que eu! [risos).
Como é fazer o Carnaval em meio a toda essa crise?
Temos que ir em frente. Ficar lamentando não adianta. A
gente busca soluções práticas. O projeto sofreu alguns ajustes, mas vai bonito
como planejamos.
Fonte: www.uol.com.br