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terça-feira, 4 de junho de 2019

‘Fissura’ aberta em 2017 se rompe com nova virada de mesa e Liesa afunda na pior crise de sua história

Por Guilherme Ayupp
Fundada em um momento de crise profunda no carnaval, em 1985, a Liesa é reconhecida como a entidade que organizou o desfile das escolas de samba e o transformou na potência turística e cultural mais representativa do Brasil. Entretanto, se aproximando dos 35 anos de fundação, a entidade enfrenta a mais profunda crise de sua história.
O que começou com uma fissura passível de ser corrigida acabou se agravando e o rompimento definitivo da paz na entidade se deu com a renúncia do presidente Jorge Castanheira, que comandava a entidade de maneira ininterrupta desde 2007. O presidente vinha sofrendo seguidas derrotas políticas dentro da Liga desde 2017, o ano onde a crise que eclodiu agora teve seu início.
Após os caóticos desfiles daquele ano, Jorginho rechaçou a possibilidade de não haver rebaixamento. Entretanto, as escolas determinaram em reunião plenária de emergência que ninguém seria rebaixada. A estratégia visava salvar principalmente a Unidos da Tijuca, que teve um grave acidente em uma alegoria e temia o descenso. Com a abertura das notas, porém, a última colocada foi a Paraíso do Tuiuti, que também sofreu com um acidente, que causou a morte da jornalista Liza Carioca. Na ocasião apenas a Mocidade foi contra a virada.
O carnaval que não terminou reservaria mais uma bomba e nova derrota política para Jorge Castanheira. Por um erro da Liesa o livro abre-alas do desfile da Mocidade não foi fornecido com uma errata enviada pela escola dentro do prazo regulamentar. Um julgador de enredo tirou um décimo da escola, que lhe custou o título. A escola recorreu e exigiu a divisão do título com a Portela. Através de um parecer jurídico a entidade afirmara não ser possível haver tal divisão. ‘Soberana’, a plenária rasgou o regulamento e determinou o empate. Castanheira era mais uma vez contrariado.
‘Por que a culpa recai sobre a Liesa se quem vota são as escolas?’
Sofrendo seguidas derrotas internas à sua revelia, Jorge Castanheira relutava em abrir mão do cargo de presidente e foi reeleito para mais um mandato depois do Carnaval 2018. Nova virada de mesa acontece sem a sua aprovação. A Grande Rio é rebaixada na apuração e consegue em mais uma plenária obscura evitar o seu desfile na Série A, além do Império Serrano. O presidente Helinho Oliveira debocha do resultado e afirma que “quem tem amigo não morre pagão”.
Um presidente do Grupo Especial que pediu para manter sua identidade sob sigilo saiu em defesa da gestão Castanheira e ressaltou que a Liesa não pode ser culpada por articulações sob as quais não possui controle.
“Jorge Castanheira conhece cada processo do carnaval. É um abnegado que se dedica diuturnamente. Por que somente a Liesa responde por essas viradas de mesa, se quem decidem são as escolas? Elas são as responsáveis”, disse.
Plenária escancarou rachas e clima pesado na entidade
A plenária que decidiu pelo não rebaixamento da Imperatriz foi extremamente tensa e pesada. A reportagem do CARNAVALESCO apurou que presidentes trocaram farpas e acusações quando o tema foi posto para discussão. Ao sair para falar com a imprensa, Jorge Castanheira comunicou sua renúncia e alegou que o motivo para salvar a Imperatriz seriam os problemas com a nova gestão da Série A.
O resultado expõe uma perda de poder inimaginável bem pouco tempo atrás. Anísio Abrahão David, presidente entre 1985 e 1987, e Capitão Guimarães, presidente entre 1987 e 1993 e entre 2001 e 2007, são dois dos grandes beneméritos mais poderosos da Liesa, ao lado de Luizinho Drumond e de Castor de Andrade, o primeiro presidente da entidade, morto em 1998.
Tanto Guimarães quanto Anísio foram contra a atual virada. Mesmo assim o desejo deles não foi acatado e oito agremiações optaram por virar a mesa. São Clemente, União da Ilha, Paraíso do Tuiuti, Mocidade, Grande Rio, Estácio de Sá, Salgueiro e Unidos da Tijuca votaram de maneira favorável. Desde a fundação da Liga, em 1985, o grupo formado por essas escolas obteve 11 títulos.
Do outro lado marcas gigantescas do carnaval não conseguiram convencer as demais a evitar uma nova página sombria na história da entidade. Somadas, Viradouro, Vila Isabel, Mangueira, Portela e Beija-Flor levaram 20 campeonatos desde que a Liesa foi fundada.
As disputas de poder não são novidade no carnaval. Elas existem desde os primórdios da festa, muito antes da criação da Liesa. Em várias fases do desfile rupturas aconteceram e ligas foram criadas e dissolvidas ao sabor de quem detinha o controle. A mais recente é a mais profunda da história da Liesa e culmina com a renúncia de seu mais longevo presidente. O modelo de desfile que a entidade consagrou teria ruído definitivamente?

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