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domingo, 9 de setembro de 2018

Antônio Caetano


Se Antônio Caetano fosse vivo, amanhã completaria 118 anos.

Antônio da Silva Caetano é uma personalidade fundamental para a história da Portela e para o carnaval carioca. Nascido em 10 de setembro de 1900, filho de João Manoel Caetano e Raquel da Silva Caetano, o jovem Antônio da Silva Caetano foi, talvez, o principal responsável pelos rumos de nosso grande espetáculo, inventando traços e códigos que, anos mais tarde, tornar-se-iam característicos das escolas de samba. Entre os grandes mestres responsáveis pelo surgimento de nossa expressão cultural maior, Antônio Caetano merece lugar de destaque. Um nome a ser eternamente reverenciado.

Morador de Quintino, quis o destino que Caetano conhecesse Diva, jovem moradora de Oswaldo Cruz, e passasse a viver intensamente a vida do bairro que deu origem à Portela. Era o início da década de 1920. Milhares de pessoas deixavam o centro da cidade e, graças ao trem, intensificavam a ocupação dos subúrbios. Um grande contingente populacional proveniente das zonas rurais do antigo Estado do Rio, do interior de Minas Gerais e de São Paulo chegava à região de Oswaldo Cruz e Madureira, trazendo manifestações culturais que formariam o aspecto peculiar da localidade, que se tornaria um produto híbrido de cultura urbana e rural. Caetano, ou simplesmente “‘Pelado”, para os amigos mais íntimos, presenciara todas as transformações por que o bairro estava passando.

Foi através da Marinha brasileira que Antônio Caetano conheceu várias partes do mundo. O contato com diferentes culturas e povos foi fundamental na formação do homem, uma oportunidade que raríssimos jovens nos distantes subúrbios cariocas das primeiras décadas do século XX puderam vivenciar. A experiência aflorou seus dotes artísticos e logo seu talento se revelaria, permitindo a Caetano assumir o posto de desenhista da Imprensa Naval. Ele sabia que seu futuro estava sendo traçado ali, mas certamente não imaginava a dimensão de seu talento, que viria a influenciar os rumos do carnaval carioca.

Há muito, Caetano já participava da folia. Integrava em Quintino os ranchos “Felismina Minha Nega” e “Felisberta Minha Branca”. Participou do bloco “Baianinhas de Oswaldo Cruz” e por iniciativa sua fundou, ao lado de Paulo Benjamim de Oliveira e Antônio Rufino dos Reis, o Conjunto Carnavalesco de Oswaldo Cruz, o primeiro nome de nossa querida Portela.

Antônio Caetano foi o primeiro secretário da Portela. Formou, juntamente com Paulo e Rufino, o triunvirato que dirigiu o Conjunto Carnavalesco de Oswaldo Cruz em seus primeiros anos. Aliás, muito do que a Portela é hoje se deve ao perfeito entrosamento desses três jovens que se complementavam nas diversas funções.

A maioria dos grandes símbolos que a Portela preserva até hoje foram concebidos pelo talento de Antônio Caetano. É de concepção do artista a atual bandeira da Portela. Segundo depoimento dado às pesquisadoras Lígia Santos e Marília Barboza, Caetano teria se inspirado no sol nascente da bandeira japonesa. Já as cores azul e branca foram adotadas graças ao manto de Nossa Senhora da Conceição, padroeira da escola. Idealizou como símbolo, por acreditar que se tratava da ave que voa mais alto, a águia, até hoje amada por todos os portelenses. Assim, é graças à genialidade de Caetano que o portelense pode reverenciar a bandeira idolatrada.

Inspirado nos espetáculos dos ranchos, Caetano trouxe para as escolas de samba a representação plástica dos temas. Com esse objetivo, usou sua ilimitada criatividade para desenhar fantasias e adereços, idealizando ainda a primeira alegoria da história das escolas de samba. Foram de sua criação os primeiros da Portela, pelos quais sempre procurou maneiras inovadoras de apresentá-los. Dentre eles, merece destaque o rústico globo terrestre giratório no enredo “O samba dominando o mundo”, desfile que deu o primeiro título da história da Portela, em 1935. Caetano, enfim, foi um dos maiores precursores do moderno espetáculo carnavalesco. Foi a partir das primeiras criações do artista portelense que o carnaval se desenvolveu. Pelas mãos de Caetano, muitos materiais passaram a fazer parte do cotidiano de um barracão de escola de samba. Por tudo isso, ele é considerado por muitos o primeiro carnavalesco da história do carnaval brasileiro.

Além de idealizar os enredos e trabalhar no barracão, Caetano também foi um exímio compositor. Sob uma mangueira, por ele próprio imortalizada em uma pintura, Antônio Caetano compôs “O quanto a paixão é capaz”, um dos três primeiros sambas da história da Portela. Em 1929, para o primeiro concurso de samba, ocorrido na casa de Zé Espinguela, no Engenho de Dentro, Caetano compôs “O sabiá”. Sempre à frente de seu tempo, o samba que Caetano apresentou no concurso tinha como peculiaridade o fato de apresentar uma segunda parte, fato bastante ousado para a época e que viria a ser uma quase regra formal do gênero.

Quando a Portela foi campeã em 1935, Caetano não foi apenas o responsável pela parte artística do desfile. É de sua autoria o samba “Alegria tu terás”, uma das duas composições que a escola levou para a Praça XI naquele ano. Caetano foi um artista completo.

Cabo eleitoral de Paulo da Portela na disputa pelo título de Cidadão-Samba, Caetano se afastou de sua escola em 1937, mas todos os anos acompanhava o trabalho de seus seguidores. Em 1941, ele viu, muito emocionado, diversas criações suas serem revividas quando a Portela contou sua própria história nos dez anos de desfiles. Naquele ano, a escola conseguiria o seu terceiro título, dando início à sequência dos “sete anos de glória”, ou seja, a conquista ininterrupta de sete títulos, entre 1941 e 1947.

Afastado há alguns anos do carnaval, Caetano aceitou participar, em 1946, dos preparativos da escola de samba Prazer da Serrinha, liderada pelo polêmico Alfredo Costa. A chegada de Caetano animou a comunidade do Morro da Serrinha, que acreditava que o reconhecido talento de Caetano poderia fazer a escola ganhar seu primeiro título. O enredo seria “Conferência de São Francisco”, que Caetano havia idealizado para a Portela em parceria com Lino Manuel dos Reis.

O samba, de autoria de Mano Décio da Viola e Silas de Oliveira, deixou Caetano bastante animado. Contudo, na hora do desfile, seu Alfredo determinou que fosse cantado o samba de terreiro “Alto da colina”, o que deixou os serranos bastante irritados. O incidente acabou motivando o movimento que culminou com a fundação do Império Serrano. Caetano participou do surgimento da nova escola da Serrinha e de suas mãos saíram os traços da famosa bandeira imperial. Ao desenhar as bandeiras da Portela e do Império Serrano, duas das mais tradicionais escolas de samba do Rio, Caetano mostrava que estava muito além das tolas rivalidades que dividiam o mundo do samba.

Artista plástico, dirigente, fundador, carnavalesco, compositor, criador de nosso símbolo maior, por incrível que pareça, tudo isso ainda é pouco para definir a importância de Antônio Caetano para a Portela e para o carnaval brasileiro. Suas contribuições foram além dos muros da Azul e Branco. Caetano é um dos principais responsáveis pela evolução por que as escolas de samba passaram em seus primeiros anos e a ele se deve muito, principalmente quando se trata dos elementos típicos de uma agremiação que sobrevivem até hoje, como os já citados aqui.

Quando exaltarmos os pioneiros do nosso carnaval, falaremos de Cartola, Ismael Silva, Paulo da Portela, Heitor dos Prazeres, Carlos Cachaça e muitos outros artistas famosos. Perto deles, pode ser que Antônio Caetano figure quase como anônimo, mas sua vida tem a mesma importância daquelas tão mais reverenciadas como precursores de nosso carnaval.
Antônio Caetano morreu em 18 de novembro de 1982.



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