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sexta-feira, 17 de junho de 2016

'O carnaval é pra quem é ousado', destaca Felipe Filósofo, no debate sobre o carnaval da Intendente

Por Vinicius Vasconcelos

O carnavalesco Luiz Fernando Reis, com passagens por Unidos de Lucas, Santa Cruz, Matriz de São João, Unidos de Cosmos entre outras, iniciou o ciclo de palestras em comemoração ao centenário do samba. Declaradamente apaixonado pelo carnaval da intendentes, ele bate na tecla de que existem dois universos do carnaval. Aquele que acontece na Sapucaí, que é muito mais para elite e para quem tem dinheiro. E o da Intendente, que acontece no meio do povo e para o povo.

- Eu vejo no carnaval de rua uma manifestação, e nos desfiles outra completamente diferente. Coincidentemente o desfile acontece no carnaval. É claro que o desfile nasceu do carnaval, eu imagino que podemos ver o desfile em junho por exemplo. Afinal, ele acontece de forma espontânea. Nos desfiles de escola de samba você é programado, tem que vestir aquela fantasia, cantar aquele determinado samba, é um carnaval muito mais formatado e esquematizado. Na Sapucaí há uma série de normas, já na Intendente vemos uma coisa muito diferente. Quem já esteve lá pode comprovar isso. É uma coisa, digamos, muito mais bonita de se ver. É claro que é um carnaval mais carente, mas ali vemos a vontade das pessoas de estar ali. Não só do desfilante, mas de quem assiste também. O que me magoa, infelizmente, é que as autoridades não se fazem presentes. Quando vai alguém, é a nível de quinto ou sexto escalão, não vai nenhuma autoridade de verdade.

A respeito do investimento dado pelo poder público, o artista faz um desabafo.

- No grupo que estou atuando na Intendente nós contamos com algo em torno de 37 mil reais. Com esse dinheiro você não faz nem uma ala da Série A, do especial então nem se fala. A gente conta muito com doações e ficamos fazendo um quebra-cabeça, pega doação com uma escola, um pouco de utra e por ai vai. No especial é possível montar um enredo e saber que há como correr atrás. Na Intendente é diferente, você faz um cata-cata. Como que faz um carnaval com tão pouco dinheiro? São recursos muito pequenos. A grau de comparação, no especial é algo em torno de 6 e 7 milhões de subvenção, na Série A, 1 milhão e 200 mil, na Intendente apenas 37 mil. É muito triste ver uma escola não ter dinheiro para pagar nem o som, ou não poder contratar um casal de mestre-sala e porta-bandeira porque não tem condição de pagar cerca de R$50,00 por ensaio.

A avenida é palco onde já nasceram diversos talentos que hoje estão na Sapucaí, e deveria ser mais valorizada, segundo Luiz.

- Acho fundamental o carnaval da Intendentes. Ali surgem novos talentos para diversos cargos como carnavalesco, compositores, passistas, ritmistas e etc. Nós que gostamos de carnaval de verdade temos que olhar com mais belos olhos esse carnaval. Se que gosta no carnaval não apóia, fica ainda mais difícil. Lá é onde acontece a verdadeira mistura de Sapucaí com o carnaval do povo.

A primeira mesa do debate foi: Entre o samba e o enredo - especificidades narrativas poético-musicais.

O compositor campeão da Sossego em 2016 abriu o debate, dizendo que é ali que há o verdadeiro entrosamento entre torcida e quem faz o desfile.

- É ali que você consegue ouvir da tia do cachorro-quente se o samba e a escola passou bem. Na Sapucaí é impossível fazer isso. Precisamos dar uma atenção um pouco maior para a Intendente, temos que olhar com mais carinho. Não concordo que alguns compositores façam sambas fracos para lá, afinal, também é um palco de belos desfiles e que merece obras à altura, é horrível quando determinado compositor fala que um samba vai funcionar ou não, a arte não é para covardes! Tem que ser ousado - concluiu o compositor do premiado samba da Unidos do Viradouro em 2016.

Ricardo Barbieri, que participa desde 2005 do carnaval da Intendentes, fazendo cobertura para sites e também como desfilante, explica que cada escola tem sua peculiaridade.

- Acompanho os três dias que as escolas passam por lá. Por lá passam escolas que estão definhando escancaradamente, e escolas que estão galgando posições em desfiles espetaculares. São climas completamente diferentes que as vezes não vemos nem no grupo especial. As escolas precisam muito do público para colaborar no funcionamento do desfile. É uma pena que tenha tão pouca divulgação dos sambas, mas mesmo assim é muito grande a interatividade do pessoal do samba quando ele é bom.

O diretor cultural da Vila, Vinicius Natal, afirma que na Intendentes há muito mais a presença do público que não vai para Sapucaí, muito por conta do preço dos ingressos.

- Lá as pessoas podem levar seus filhos tranquilamente, e ficar bem a vontade. São logicas diferentes e não tem nem como comparar as escolas da Intendentes com Sapucaí, mesmo sendo todas numa mesma hierarquia. São escolas que devem ser respeitadas a partir de suas particularidades. E é a partir do enredo, que corremos atrás das possibilidades de patrocínio e da narrativa que a escola vai ter que se empenhar. Eu acho que o carnaval como um todo, mas principalmente na Intendentes é um lugar de novos significados. Algumas pessoas falam da invisibilidade daquele carnaval, mas a prova de que o carnaval da Intendentes não é invisível, é o que acontece hoje, por exemplo. Superlotamos hoje o local do debate com várias pessoas interessadas em saber um pouco mais sobre lá. Existem muitos sambistas que vivem muito mais Intendentes do que Marquês de Sapucaí.


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